No berço da noite
A sombra cai num casebre da Terra.
Depois de regurgitar no chiqueiro,
o vento serpenteia debaixo da jaqueira.
No grato asilo da natureza,
é de afã que apodrecem os cheiros.
O pálido cetim da tez menina
fecha lânguidos olhos num pesadelo.
Túmidos suspiros arquejam do peito infante:
estos de um sol que nunca veio.
Longe, a cantiga dos tambores de vodu.
Perto, no cinéreo vapor, a noite desbota
num verso incerto de um céu sem deus,
e a menina adormece sob as notas do sino do inferno.
Em penumbra surge de um dorso pardacento,
o sexo flácido revelado pela luz de uma lamparina.
Dedos longos de um diabo sagaz rasgam o véu púrpuro,
e o lençol do leito infante agora é rubro.
A menina planeja um grito em sua boca não grita.
La fora, late o parco cão que vela o casebre.
O vento transpira o odor da lamparina a querosene.
Os tambores do vodu emudecem.
O cão reza um terço com as patas na cabeça.
É vermelho o silêncio da Terra.
PS: Este poema é uma releitura de um excerto de Crepúsculo nas montanhas
de Álvares de Azevedo. Trata-se de um poema autobiográfico em respeito a todas as crianças vítimas de violência sexual, àquelas que não suportando o sofrimento psíquico optaram pelo autoextermínio e àquelas que sobreviveram, mas seguem em eterna angústia. Foi deste poema também que nasceu o romance O Cortador de Hóstias, ambientado na cidade de Pirenópolis Goiás, em 1918, conta a história de Flor Maria, uma adolescente de quatorze anos que orquestra uma vingança contra o abusador de sua infância.
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